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Após a maxissérie
Crise nas Infinitas Terras, surgiu um novo Super-Homem, reformulado pela artista
John Byrne, que havia se consagrado por seus trabalhos na Marvel Comics. Ele escreveu e desenhou a minissérie
The Man of Steel, com o propósito de apresentar o Homem de Aço a uma nova geração e resolver muitos dos problemas que, na sua visão, prejudicavam o personagem. Todos os elementos da mitologia, trabalhados ao longo de cinco décadas, estavam perdidos; aqueles que fossem repensados por Byrne, teriam seu espaço, outros deveriam ser esquecidos. Enquanto Byrne assumiu as revistas
Superman e
Action Comics, o terceiro título,
Adventures of Superman, ficou a cargo de
Marv Wolfman, o próprio autor da
Crise, em parceria com o desenhista
Jerry Ordway. Ainda hoje, a mudança gera polêmica: Byrne queria se desfazer dos excessos e retomar os conceitos originais do personagem, aproveitando as abordagens da série de TV e do cinema. Contudo, foi tão radical que acabou eliminando muito do apelo básico do herói e criando algo diferente e quase irreconhecível para os antigos fãs.
O maior diferencial da origem do Super-Homem de John Byrne dizia respeito ao planeta
Krypton e a sua criação por
Jonathan e
Martha Kent. Para o artista, a ligação emocional do herói com seu planeta natal era um problema, pois ele reverenciava mais sua herança kryptoniana que a terrestre. A solução adotada foi fazer de Krypton um planeta estéril e sem emoções, uma visão distópica da sociedade, onde experimentos na área e clonagem geraram guerras e devastações, resultando num mundo frio que, segundo o próprio autor, merecia explodir. Assim sendo, Kal-El é achado pelos Kents e criado segundo seus elevados valores morais, com poderes desenvolvendo-se gradualmente na sua juventude, em
Smallville. Entra aí outra diferença: Clark Kent passou a ser a verdadeira personalidade do herói, e o Super-Homem, apenas um disfarce. Convém ressaltar que este novo Clark estava longe de ser o tímido e pacato personagem imaginada por
Jerry Siegel e
Joe Shuster, mas fora um campeão de futebol americano no colégio e se tornou um jornalista famoso e romancista de sucesso em Metrópolis. Além disso,
foi eliminado o passado como Superboy, a amizade com Lex Luthor, e todos os outros sobreviventes de Krypton, como a Supermoça, os criminosos aprisionados na Zona Fantasma, Krypto, e a cidade engarrafada de Kandor. O Super-Homem deveria ser único. Com seus poderes reduzidos, carência do elemento trágico em sua origem – tanto por Krypton quanto pelo fato de os Kents continuarem vivos -, e a mudança na dicotomia Clark Kent/Super-Homem, o resultado foi apenas mais um super-herói.
O vilão
Lex Luthor foi reinterpretado por Byrne seguindo uma proposta de seu colega Marv Wolfman. No lugar da mente criminosa mais brilhante de todos os tempos, entrava o homem mais rico do mundo, dono de Metrópolis e intocado pela lei. Luthor erguera o império Lexcorp, com base na invenção de um caça arrojado, e ocultava bem seus atos criminosos, sendo visto como um filantropo. Byrne deu prosseguimento à origem do Super-Homem nas minisséries
O Mundo de Krypton,
O Mundo de Metrópolis e
O Mundo de Pequenópolis (Smallville). Nas revistas mensais, apresentou versões mais realistas de vilões clássicos em histórias apenas regulares, enquanto apresentava encontros do Super-Homem com grandes heróis do Universo DC. Seu Super-Homem não era membro da
Liga da Justiça, perdendo um pouco da força inspiradora do ideal heróico no mundo. O ponto forte foi a reformulação de
Lois Lane, agora uma mulher de personalidade muito melhor definida. Wolfman retomou um pouco da preocupação social das primeiras histórias do Super-Homem, abordando questões urbanas como tráfico de drogas, guerra de gangues e ataques terroristas provocados por ditadores. Contudo, ele acabou afastado devido a divergências criativas com a editora. E Byrne viria a cometer seu maior equívoco.
Para explicar a existência da Legião dos Super-Heróis no século 30, Byrne criou um
Universo Compacto onde existiam apenas o planeta Krypton e a Terra. Nesta realidade, a história seguia a mitologia pré-Crise, e nela existia um
Superboy que se encontrava com os
Legionários. O roteirista aproveitou a oportunidade para trazer de volta também a Supermoça, mas numa versão diferente: ela era uma matriz de protoplasma capaz de alterar sua forma, dotada de poderes telecinéticos, e guardava muito pouco de sua contraparte da
Era de Prata. O conceito do Universo Compacto desagradou os editores da DC Comics, que ordenaram a sua destruição. Portanto, a última saga de John Byrne com o personagem foi também a mais polêmica. O Super-Homem é incapaz de impedir que a Terra do Universo Compacto seja devastada pelos kryptonianos fugitivos da Zona Fantasma e, transtornado, comete um ato imperdoável: “executa” os criminosos com kryptonita, a sangue frio, estando eles já derrotados. Este Super-Homem já não era mais um super-herói capaz de nos inspirar ou gerar identificação, era um fracasso em todos os níveis. Após a saída de Byrne, o personagem voltou a uma fase de boas histórias pelas mãos de novos roteiristas, como
Roger Stern, Dan Jurgens, George Pérez e
Jerry Ordway.
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Ainda que eles estivessem escrevendo uma versão “marvelizada” do Super-Homem, a seqüência de histórias funcionava. Essa geração de artistas soube trabalhar bem as relações de personagens coadjuvantes, dando vida à cidade de Metrópolis.
Cat Grant, José Delgado/Predador, o Guardião e a
Legião Jovem, O Professor Emil Hamilton, além dos clássicos
Jimmy Olsen, Perry White e Lois Lane brilharam como nunca. O Super-Homem alcançou redenção exilando-se no espaço, onde também aprendeu mais sobre sua herança kryptoniana. A relação com Batman, que mudara de amizade para respeito mútuo com a reformulação dos dois personagens, passou a evoluir. Histórias fechadas de interesse humano e grandes sagas foram produzidas no período, como
“O Dia do Kryptoniano”,
“Perdido no Tempo”, e a mais importante,
“A ameaça da Kryptonita Vermelha”. Nesta história o Super-Homem viu-se privado de seus poderes, e pôde repensar sua relação com Lois Lane, pedindo-a em casamento. Num final surpreendente, ela aceita o pedido. Estava tudo pronto para o enlace, até que a série televisiva Lois e Clark exigiu que a história fosse adiada. A solução dos roteiristas dos quadrinhos foi uma saga muito mais bombástica:
A Morte do Super-Homem. Atraindo a atenção maciça dos leitores e da mídia, em 1992 a edição
Superman 75 chocou o mundo com o Homem de Aço morrendo ao enfrentar nas ruas de Metrópolis o monstruoso
Apocalypse. Para os roteiristas do personagem, era apenas o início de uma saga, mas para o mundo, parecia ser definitivo. As duas sagas que se seguiram estão entre as melhores, justamente por mostrar as conseqüências da morte do Homem de Aço.
“Funeral para um amigo” mostrou o mundo sobrevivendo sem seu maior herói. Depois foi a vez de
“O Retorno do Super-Homem”, que introduziu quatro supostos Super-Homens: um novo
Superboy, Aço, Ciborgue e o
Erradicador, além do retorno triunfal de Kal-El.
Os novos personagens voltaram a ser explorados com o sucesso da saga, Superboy e Aço ganharam revistas próprias, e a franquia Superman tornou-se novamente um fenômeno de vendas. Contudo, os roteiristas haviam plantado as sementes de sua própria decadência. Após o “Retorno”, tornaram-se escravos da fórmula de megassagas e eventos bombásticos, enchendo as revistas de personagens coadjuvantes e diminuindo cada vez mais a relevância do Último Filho de Krypton. Destacam-se
“O Casamento do Super-Homem”, em 1996, e sagas sofríveis como a do
Super-Homem Elétrico, que se desdobra na saga dos Super-Homens Azul e Vermelho. Fora das revistas de linha, contudo, três roteiristas que admiravam a mitologia e o idealismo do Super-Homem pré-Crise começaram a resgatar seus valores e mudar os rumos da história.
Reino do Amanhã, de
Mark Waid e
Alex Ross,
Super-Homem: As Quatro Estações, de
Jeph Loeb (ex-roteirista e produtor de "Smallville") e
Tim Sale, e a nova Liga da Justiça, de
Grant Morrison (que futuramente escreveria
"All-Star Superman",
"Batman R.I.P" e
"Crise Final"), trouxeram de volta o potencial icônico do primeiro super-herói. Com a entrada de novas equipes criativas em 1999, tendo à frente os roteirista Jeph Loeb e
Joe Kelly, não haveria mais limites para o Homem de Aço.
Uma forma errônea de visualizar o retorno de elementos passados à cronologia é considerar o movimento como pura nostalgia, quando ocorre algo bem diferente. Loeb e Kelly investiram na grandiosidade do herói e reintroduziram elementos clássicos, mas com reviravoltas surpreendentes. Em meio a sagas cósmicas, houve histórias intimistas que desafiaram o Super-Homem em nível pessoal. O casamento com Lois Lane, que para muitos significaria estagnação, rendeu histórias emocionantes e cenas apimentadas. Numa das tramas mais ousadas de todos os tempos, Lex Luthor foi eleito presidente dos Estados Unidos, possibilitando críticas políticas e uma análise mais fria do “ideal americano”. Na saga
“Retorno a Krypton”, o Super-Homem reencontrou seus pais biológicos, na visão otimista do planeta idealizada por Siegel e Shuster. O supercão
Krypto também foi trazido de volta, mas perfeitamente adaptado aos novos tempos. Em 2003, uma nova origem foi apresentada na maxissérie
Superman: O Legado das Estrelas, escrita por
Mark Waid e ilustrada por
Leinil F. Yu, mesclando diferentes versões de forma coesa e inteligente. Foram reinventados o planeta Krypton, representando agora o espírito de pioneirismo e coragem universal, a amizade de Clark Kent e Lex Luthor quando adolescentes, e a própria essência do Super-Homem.
Kurt Busiek e
Stuart Immonem produziram
Superman: Identidade Secreta, sobre um Clark Kent no mundo real.
Brian Azzarello e
Jim Lee levaram o personagem ao topo da lista de mais vendidos com a saga
“Pelo Amanhã”. Nas páginas de
Superman/Batman, Jeph Loeb trouxe de volta
Kara Zor-El, a Supermoça da Era de Prata, agora um pouco mais rebelde, que passou a integrar a L
egião dos Super-Heróis. E Grant Morrison e
Frank Quitely dão uma aula de mitologia moderna em
All-Star Superman (Grandes Astros: Superman).
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Em decorrência da sombria
Crise de Identidade, assinada pelo romancista
Brad Meltzer, e em comemoração dos 20 anos de Crise nas Infinitas Terras, a DC publicou em 2005 a minissérie
Crise Infinita. Produzida por
Geoff Johns (que viria a ser um dos melhores roteiristas de Superman, Lanterna Verde e Flash, além de comandar a DC!) e
Phil Jimenez, a nova Crise abala as estruturas do Universo DC, mas já se pode dizer que as conseqüências são positivas. Kurt Busiek teve uma ótima fase como roteirista de Superman, e
Richard Donner (diretor do clássico
"Superman: O Filme") escreveu 2 histórias em parceria com Geoff Johns nas páginas de Action Comics.
E
James Robinson e
Greg Rucka escreveram duas das melhores sagas do Superman:
"New Krypton" e
"World of Krypton".
Já não há pretensão de desconstruir ou modernizar um herói definitivo. Que venham essas novas super-histórias.